sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Pour Elise


Quando acordou ja estava morta. Tentou se lembrar de alguma coisa. Mas, nada, nem mesmo de seu nome. Só sabia que estava ali, acordada e morta! Andou pelo quarto do qual não se lembrava. Olhou pela janela a paisagem, aparentemente nunca vista. O tapete estranho com estampas florais estava amontoado em um canto. Acima da cama, um quadro com um barco à vela lutando contra ondas gigantes. Os porta-retratos exibiam sorrisos desconhecidos. Olhou sorriso por sorriso, algum deles deveria ser o seu. Rondou pelo quarto à procura de um espelho. Encontrou-o na tampa de um porta-jóias que tocava Pour Elise quando aberto. Fitou-se ao som da melodia. Seus olhos negros, seu nariz aquilino, sua boca fina, seus cabelos encanecidos, seus dentes pequenos, suas rugas profundas, nada ali lhe era familiar. Apenas uma coisa, a música. Lembrava-se da canção e dos caminhões de gás que a tocavam pelas ruas. Que ruas? Tentou sair do quarto, a porta estava trancada. Voltou à janela, parecia alto demais pra pular. Estava morta, que diferença faria? Subiu no parapeito, levando consigo o porta jóias. Não sentia medo, não sentia nada. Pulou. Ao tocar o chão, não tentou se levantar. Ficou ali, deitada. Alguns gritos e algo parecido com uma sirene misturaram-se ao som familiar do porta-jóias que ainda tocava. Embalou-se e dormiu, morta.

Rick Sadoco
      

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