terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Tomates, Cebolas e um Feliz Ano Novo

O dia primeiro de dezembro entrou na vida dela berrando feito um despertador. Faltava só um mês para o fim do ano! E o que ela fez durante todos esses dias? Só lembra de ter chorado, falado no ex e chorado mais um pouquinho. Chega! Era dia 01/12 e ela precisava terminar com o término daquele namoro. Estava solteira há meses, era hora de agir como tal. Enquanto planejava sua agenda do fim de semana, preparou um belo jantar. De entrada: salada de tomates com muuuuuita cebola. Desde o início do namoro fracassado, ela evitou as cebolas porque ele as odiava. Agora, estava livre. Comeu sua salada de cebolas e tomate com um prazer quase orgásmico. Antes de partir para o suflê percebeu que estava faltando algo. Um brinde. Decidida como nunca, partiu em busca do vinho perfeito. No caixa do supermercado, com seu Catena Zapata na mão, sentiu-se poderosa. Era quase uma estrela de cinema mesmo com seu shortinho branco e a camiseta velha do Mickey. Seu momento tinha até trilha sonora. I Will Survive tocava às alturas dentro da sua cabeça. Estava oficialmente viva.


Uma cutucada nas costas arruinou a cena. Era ele, o ex, de mãos dadas com a namorada – Linda, diga-se de passagem. Ele sorriu, cumprimentou a ex-poderosa do supermercado. Ela pensou que talvez fosse desmaiar ou morrer. Tentou dizer oi...Nada saia. Só "gruídos". Tentou mais uma vez e lembrou que além daquela roupinha miserável estava com um bafo de cebola terrível. Então, sorriu deu um tchau e saiu com o vinho em baixo do braço.

Ainda gostava do ex. Teve certeza disso. No entanto, estava firme no propósito de mudar, de entrar com pé direito e coração aberto no ano que ia chegar. Antes que All By myself começasse a tocar na cabeça, ela colocou uma música animada e manteve os planos: Jantou seu jantar, tomou seu vinho e seguiu a agenda de solteira durante o fim de semana inteiro. Depois daquele dia do supermercado, as ligações do ex ficaram frequentes. Mesmo sem saber o que ele queria, não atendeu. Nunca mais. Faltava só um mês para o réveillon e tudo que ela queria era uma história nova em 2012.

Mal sabia ela que no dia 1/12, no supermercado, ele a olhou de um jeito diferente. A segurança dela o fascinou. Admirou-a como nunca. Sentiu saudade. Tudo o que ele queria em 2012, era aquela velha história.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

A TURMA DO 301

Quando ela chegou, a festa já estava rolando há algum tempo. Já no hall de entrada, sob a estranha luz avermelhada ela se arrependeu de ter ido. Era uma festa estranha, com gente esquisita. O único móvel na sala era um sofá. Nele, duas mulheres analisavam com afinco os convidados. Não faziam questão de esconder que também achavam aquela gente toda muito estranha. Alheia ao sofá, estava toda aquela gente estranha. Era uma gente de idades diferentes, tribos diferentes, sotaques diferentes, sexualidades diferentes, culturas e crenças diferentes. Que mistura estranha: essa gente, tão diferente entre si, junta. Do hall de entrada ela os observava. Pareciam exagerados, saídos de uma cena teatral. Ela, sem dúvida, não se encaixava. O sofá e as mulheres que o habitavam pareciam o porto mais seguro para os cinco minutos que permaneceria naquele local. Ela já se encaminhava para lá, quando DJ lançou uma música pré-histórica. A canção fazia parte da infância dos de 30, da adolescência de 40 e da fantasia dos de 20. Mas, todos sem exceção, de 20, 30, e 40 saíram de onde estavam para dançar e cantar juntos uma música bobinha do Balão Mágico. Se a situação já era estranha, passou a ser inacreditável. Só uma cerveja podia salvar a vida dela naquele momento. Antes de sentar no sofá, foi até a geladeira. Da porta da cozinha, sem mais nem menos, virou-se e olhou para sala. Que engraçado! Dali, de onde estava, a luz vermelha do Hall pareceu acolhedora. Daquele ângulo, aquelas pessoas não pareciam tão estranhas. Eram tantas idades, tribos, sotaques, sexualidades, culturas, crenças... que se misturavam perfeitamente. Seus gestos, palavras e gargalhadas se encaixavam na cena. Parecia tudo muito pensado por um diretor de cinema. Como aquela mistura de diferenças podia ser tão harmoniosa? Ironicamente, a música bobinha que deu a resposta: Eram "amigos, amigos do peito, amigos de uma vez"! O resto era detalhe.


Então, ela pegou a cerveja, mas não foi para o Sofá. Invadiu a pista de dança e se misturou. Sem saber, naquela noite, ela estava conhecendo pessoas que a acompanhariam para o resto da vida.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Mulher Berinjela

       - Berinjela é bom pra depressão e ajuda a emagrecer.
   Ouvir essa frase transformou sua vida e rotina. Não sei  se há comprovações  científicas sobre a afirmação, mas foi o suficiente para ela.
      Berinjela tornou-se um obsessão.
     -Estou me sentindo outra pessoa depois que incluí berinjela na minha dieta. Você devia experimentar. – disse a um amigo próximo.
      - Eu não gosto muito de berinjela.
    - Ah, mas você pode fazer berinjela de várias maneiras, berinjela assada, berinjela recheada com cotagge, berinjela no vapor, berinjela grelhada, só não aconselho berinjela à milanesa embora seja muito gostosa. Tem lasanha de berinjela, berinjela em conserva, pasta de berinjela, salada de berinjela com maçã, berinjela seca, berinjela capri, rolês de berinjela, até carpaccio de berinjela. Berinjela, berinjela, berinjela, berinjela...
      O som da palavra repetida pela amiga e ouvida tantas vezes fez com que o interlocutor perdesse, por algum tempo, o significado dela, tornando a “berinjela” um vocábulo estranho. Pensava e a única coisa que lhe vinha à mente era o rosto dela, da obsessiva.  Imaginava a amiga em uma saladeira rodeada de maçãs, em um forno com a boca cheia de cotagge, em uma compoteira de vidro e até à milanesa. Saiu do bate papo atordoado. Passou na mercearia e comprou a maior berinjela que achou. Em casa lavou a leguminosa, fez-lhe um buraco , foi para o quarto, tirou toda a roupa e deitou-se na cama. Olhou a berinjela com ternura e volúpia. Tinha obsessão pela amiga.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

O Antídoto

Tinha obsessão pela Morte. De certa forma, sempre soube que ia morrer cedo. Não sei se a revelação se deu na infância, quando perdeu o pai precocemente ou, se na adolescência, quando se encontrou secretamente com algum tipo de cartomante ou vidente. Ou foi uma cisma, num dia de sol ou de chuva qualquer. O fato é que, um dia, ele cismou com a “velha senhora”. Teve medo da Morte. Ele tinha a certeza que a vida lhe seria tirada a qualquer momento, por um motivo fútil qualquer. E correu da Morte, como quem corre os cem metros rasos na olimpíada. Corria prestando atenção e curtindo cada segundo de suor, esforço, dor e euforia do trajeto. Naquele dia da cisma, foi dada a largada. Ele mergulhou de cabeça no trabalho, nos romances, na família, nos amigos, nos eventos. Pouco descansava, pois sabia que o tempo era curto. Para vocês terem uma idéia melhor sobre o que estou tentando dizer, vou narrar um metrinho da maratona dele: eis que um dia ele estava, a trabalho, em terras paulistas. Lá, soube que sua mulher havia entrado em trabalho de parto. Não podia perder o nascimento do seu filho, mas não havia vôos. Os poucos vôos que restavam naquele dia, estavam lotados. A tendência seria entrar em pânico, mas como isso o faria perder mais tempo do pouco que sabia que tinha, ele raciocinou. E na fila intensamente cheia de uma companhia aérea qualquer, começou a contar, para cada passageiro, a sua história e as razões pelas quais não poderia perder aquele acontecimento. Uma senhora se compadeceu e por um milagre conseguiram trocar as passagens. Sim, ele chegou a tempo de ver o seu primogênito nascer. Também conseguiu chegar a tempo para os aniversários de 1, 2, 3, 4...o nascimento do seu segundo filho, 5, 6, 7...formaturas, casamentos. Aos 60, o velho medo tomou forma, cheiro e cor. Mas ele queria ver o nascimento do seu primeiro neto e resistiu. Minha última lembrança dele é uma sonora gargalhada. Horas depois de ter falado com ele ao telefone soube que tudo se complicara naquele quarto de hospital. E que finalmente a linha de chegada tinha chegado para ele.


Em meio ao silêncio deixado, tive oportunidade de pensar sobre tudo. Cheguei à conclusão de que seria injusta se definisse esse homem como um obcecado pela Morte. A fixação era o antídoto, era a dose diária de impulso para a corrida. O justo mesmo seria recomeçar esse texto com outra frase. Porque nunca, em toda minha existência, vi alguém mais obcecado pela vida do que ele. E ao som daquela gargalhada encerro minhas palavras e meus pensamentos por hoje...

PS: Em homenagem ao primo Beto e seu jeitinho Carpe Diem de viver.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

A Hora Do Adeus

Domingo, 11:55 da noite.
Faltam 5 minutos para o início do resto de sua vida.
4: o último brinde!
Sabia o que estava por vir.
3: O último suspiro!
E não seria fácil.
2: O último grão de felicidade!
Sensação de vazio.
1: O último gole!
A difícil nova fase.

Segunda, 00:01
Dia internacional da dieta.
Felicidade, te encontro daqui a alguns meses,
Na esquina da praia com a rua Verão.



quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Despedida


Numa troca de olhares...
   A cumplicidade...
      Tristeza camuflada por sorrisos duros...
          Palavras ocas em frases murchas.
             No silêncio dos olhos...
                As compreensões, os perdões e as promessas.
                    Num olhar...
                        No silêncio...
                            Tudo o que se faltou dizer.
                                Num abraço apertado...
                                     No acenar das mãos...
                                         Os olhares...                
                                                                                         ...a despedida.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

A GRAMA DO VIZINHO

Da janela lateral


Débora chegava mais ou menos na mesma hora, linda e decidida. Passava pela sala apressada. Voltava pouco depois: Cabelos molhados, robe, taça de vinho na mão. Sentava-se à mesa, jantava, falava ao celular e apagava as luzes. Tinha dias em que o Príncipe, o namorado loiro, de porte atlético aparecia lá e eles se perdiam um no outro. No fundo, eles se achavam um no outro, com a ânsia de quem pode se perder para sempre no minuto seguinte.
Há anos, Ana acompanhava a vida de Débora, da janela lateral do quarto dos filhos. Débora - era assim que Ana a chamava para si. Débora, um nome forte, talvez o único que lhe coubesse bem- com seu pequeno ritual que acontecia exatamente na hora em que Ana cumpria a tarefa árdua de botar os seus para dormir. Ana lidava bem com a inveja confessa que sentia de Débora. Apesar da presença da vizinha lembrar a Ana tudo o que ela não era, aquela mulher trazia o conforto de existir uma possibilidade de vida diferente da sua própria. E de uma forma particular, Ana tinha a liberdade durante alguns momentos do seu dia, de ser o que gostaria de ter sido: uma mulher de personalidade com alguém que a amasse do seu lado. E diariamente vivia momentos em que ela podia simplesmente não ser Ana.

Da janela da Sala

Gabriela nunca teve certeza de que escolheu a profissão certa. Talvez por acomodação ou falta de entusiasmo de fazer outra coisa, continuava ali. Continuaria ali para sempre. Não pensava muito no que sentia. Todo dia era a mesma coisa: academia, trabalho, casa, banho, jantar, vinho, telefone, cama. E estava tudo bem. Estaria tudo bem. Até que um dia depois da maratona sexual, Gabriela se aproximou da janela e olhou, sem querer, a janela da vizinha. Era um dia de semana e já amanhecia. A vizinha estava absorta no ritual de acordar os filhos. Ela cantava e os meninos iam acordando aos poucos com certa resistência. Aos poucos foram cedendo à mãe. Em poucos minutos estavam os dois meninos arrumadíssimos para ir à escola. E todo o ritual pareceu leve como brincadeira de criança. Saíram do quarto os três às gargalhadas.

Gabriela nunca se sentiu tão exausta na vida. Percebeu que estava cansada de tudo, do seu trabalho, da sua vida, da sua solidão. Sentiu uma leve carícia na cabeça. Era sinal que seu amante estava partindo, como sempre, para o lugar onde pertencia. Tudo o que Gabriela queria naquele momento, era ser feliz como a mulher da janela lateral.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Fantasia



- Mamãe, acabou. Coloca de novo.
- Mas essa foi a terceira vez.
- O que houve?
- Aurora quer assistir Branca de Neve outra vez.
- Minha filha, tem tantos outros aqui. Três Porquinhos?
- Não.
- Chapeuzinho Vermelho.
- Não gosto de lobo, papai.
- Cinderela? É outra princesa linda.
- Pode ser esse?
- Pode.

“ O sonho é o desejo d´alma. N´alma adormecer...”

- Mamãe, acabou.
- Mas essa foi a terceira vez.
- O que houve?
- Aurora terminou outra vez.
- Minha filha. Já é o terceiro namorado esse mês.
- Nenhum homem presta, papai.

“N´alma adormecer...”  “N´alma adormecer...”  “N´alma adormecer...” ... Zzzzzzzz.

domingo, 12 de junho de 2011

Feliz Dia da Independência Russa


O dia já começou assim com dores no estômago, enjôo, agonia de estar sozinha. Era dia dos namorados. O primeiro do resto de sua vida e ela tinha certeza que esse seria sem flores e sem bombons.  Tinha um medo gigante de que sua vida fosse ser sempre assim daqui para frente. Tinha medo de ficar solteira para sempre. Tinha medo de não encontrar o homem da sua vida. No fundo, nem acreditava mais nisso, mas a pressão daquele dia a fazia sentir uma fracassada. Claro, lá no fundo tinha uma esperança que algum milagre acontecesse. Por isso entrou no Facebook. Talvez tivesse uma mensagem...Um convite...Nada. Não para ela. Depressão, solidão, depressão. Estava disposta a se suicidar num copo de coca-cola, sem ser zero, às 10 da manhã. Ia dar o primeiro gole quando o milagre aconteceu.
Não era um telefonema, ou mensagem, ou flores, era só o post de um amigo: Feliz dia da Independência da Rússia. Em algum lugar do mundo não se comemorava o maldito dia dos namorados! Sim, sua vida estava salva! Ela decidiu entrar no clima da festa... deles. Jogou na pia o líquido venenoso e cheio de calorias que tinha no seu copo e começou a organizar a sua festa. Convidou os amigos, os amigos dos amigos (podia ser que aparecesse algum solteiro interessante) enfeitou a casa, fez o playlist. Até traje típico inventou. O dia passou que ela nem viu. Chegaram os amigos, as vodcas, os amigos dos amigos. Entre vodcas, risos, babalaicas, amigos e amigos dos amigos ela se deu conta. Estava feliz. Solteira e feliz. Sem flores, sem bombons e feliz. Além da independência da Rússia, estava comemorando a sua própria.  E brindou à vida e a todas as possibilidades que poderiam surgir daí para a frente.